De costas para o rio...

Quero questionar-me, questionando-vos. Adoro a Paz real, aquela que brota sorrisos... Quero cantar sentimentos, desafiar os olhares do coração... Quero contar consigo, na parceria desta viagem... Por isso não quero ir para o mar, quero procurar as razões que dão amor... e, dele fazer um canto louco de alegria...

Nome:
Localização: Barreiro, Setubal, Portugal

sou alguém que é feliz...

sábado, novembro 26, 2005

Foi há 47 anos...

A festa dos meus 16 anos...

Estávamos no ano de 1958, Novembro, quente e húmido, e a 27 desse mês fazia dezasseis anos... Queria fazer uma festinha a comemorar... que não fosse o tradicional apagar das velas, e do lanchinho aos meninos e meninas, coleguinhas de escola... Queria mais, queria um bailinho, nome que mais tarde, integraria numa outra verbalização mais condizente, com as poupinhas da época (Elvis e Pat Boone) - um "party", "yes", à inglesa curta, para dar mais "sainete"... Pois, era o despertar do menino, feito jovem, feito... "tolinho da silva", numa época de arrumações sem fim, em armários que não conhecia... pêva! Que linguagem esquisita, pensava eu, quando minha Mãe dizia "... 'tá tolinho, 'tá na idade do armário..." Veio a negociação, dos convites, com a Mãezita a fazer contas à paparoca... A Manuela (depois esposa do Romão - Parafuso) e nossa professora de dança, o Toninho (Diabinho), esse era fundamental, mais o Zé Manel (Bettencourt), o Casimiro e o irmão Emílio, o Beto e o Mica (irmãos do Diabinho), o Carlos Manel, o Carlos Antunes Baptista, depois as meninas, a "mana" Candinha (Kiki), e a prima Zélia, a Paula Silva, a Isabel, a Emília, a Anabela e a mana Ana Maria, a Mia, aTeresa e a Luisa Bettencourt... e o filme já se desenrolava, ali mesmo à frente do meu nariz. No Umpala, a casa tinha aquele pátio, mesmo a calhar, com sombra frondosa de duas acácias gigantes, e a pista de dança era bem larguinha... Adultos, pois claro, os papás de alguns, os Moreiras, os Bettencourt, os Amilcar Rodrigues.... Tudo planeado, faltava só do Língamo a Maria Emília e da Matola a Luisa (nossas companheiras de viagem, diária...mas era longe e, não havia quem se responsabilizasse... naquela altura era assim...
O dia chegou...
E, foi mesmo a 27, porque era domingo. O dia nasceu lindo, aos meus olhos era mesmo esplendoroso. Mais do que as prendas eventuais, que na época se usava, queria era experimentar o bailinho... Cá dentro, alguma coisa se estava a mostrar... Inquieto, não sabia o que era e, com a voz a mudar ( o que me irritava de sobremaneira) queria experimentar algo que não sabia bem o que era. O almoço em família foi longo, o tempo decorria vagaroso, as horas de receber os convidados demorava, e a paciência começava a dar sinais, de algum inconformismo, na dolorosa contenção.... Mas, tempo é tempo, não pára, e de repente começaram todos a chegar, com uma alegria bem patente naquelas "caritas laroucas"... Os mais velhos estavam como eu, era a primeira vez em que participavam como intérpretes, não como assistentes tolerados... A primeira dança foi de sucesso para o Carlos Antunes Baptista, com um rock do Elvis, dançado com a Paula... Todos dançaram, claro, mas as outras músicas eram bem mais, como direi, difíceis, mais agarradinhos, e com aqueles adultos todos a assistir, cheios de curiosidade, naquele primeiro bailinho formal, dos... miudos, era quase desencorajante... Mas, tudo começou a entrar na rotina, com a alegria que todos passavam, de uns para os outros. As horas passavam depressa, agora parecia que o tempo tinha acelerado, feito Ferrari, em dia de grande prémio... com o Juan Manuel Fângio, pois claro! Foi uma tarde inesquecível, ainda há pouco tempo o confirmei com vários dos presentes, foi um marco, em relação, à mudança de sentido, nas nossas vidas. (não é Diabinho, mano?).
Foi assim que o Umpala, entrou na história de alguns de nós, e haveria de voltar a assinalar e de que maneira... Quando se lhe toma o gosto... E passaram-se 47 anos, quem diria, hein? E ainda hoje gosto imenso de dançar... há até quem diga que danço bem... imaginem só...

quarta-feira, novembro 23, 2005

O fascínio dum sonho, ou a princesa e o arco iris...


O arco iris... e a Princesa...Quantas vezes em adultos, nos dá vontade de voltarmos atrás e... sermos crianças?Sonharmos com princesas, castelos, arco iris gigantescos? Quantas vezes? E, como é bom saborear segundo a segundo esses sonhos? Pois, neste interregno nas memórias, volto à poesia, para vos revelar um sonho desses... Pois, é verdade! Sonhei, há tempos, com uma princesa e com um arco iris... A verdade verdadinha, é que se calhar, é mais uma mexidela nas minhas memórias... Será? Que conotação terá com a praia do Bilene, e no que contei antes? Digam-me...

O ARCO IRIS E A PRINCESA...


Era uma vez,
na terra do arco-iris,
naquele palácio das côres,
onde te buscava com sofreguidão.
Era um ritual de súbdito leal,
à minha princesa do reino,
do reino da minha fantasia.
Quando te apresentavas, linda,
naquele varandim real, florido,
eu me curvava à tua beleza,
e o meu coração batia mais forte,
oh princesa das princesas,
princesa do meu reino!
Um dia, aquelas nuvens,
negras, negras, apareceram,
e tudo taparam à sua volta!
O arco-iris deixou de se vêr!
A tristeza se instalou,
e todos se curvaram,
perante o desaparecimento
daquelas côres vivas, reais...
As nuvens se esfumaram,
mas o meu reino não voltou!
Procuro-te naquele varandim,
e o teu rosto ali já não mora.
Olho então o céu e espero,
que me traga o meu arco-iris,
inunde o meu reino de fantasia,
de luz multicôr, e me devolva,
a minha linda princesa!



sexta-feira, novembro 18, 2005

Bilene, fascínio dum amor de praia...



Bilene, fascínio dum amor de praia...
Deitei-me cêdo. Não estava com muito sono, mas estava exausto. Tinha arrumado tudo, e preparado exaustivamente a mala dos artifícios da pesca. De madrugada, partia para o Bilene, com os meus amigos e as perspectivas eram grandes: bom isco, boas canas, bons anzóis, empates em quantidade, amostras, enfim tudo.
Mas o sono não vinha, e enquanto isso se não resolveu, fui recapitulando tudo o que na véspera havia acontecido. Aquela cara não me saia da memória. Estava a resolver um “luto” de amor, uma perdida que o tempo começava a curar. A nossa curta conversa tinha sido animadora. A empatia que sentíamos era evidente. Era a rampa de lançamento, para mais altos voos... Mas aquela ideia da pesca vinha mesmo no momento errado... E, se por causa da pesca perdesse aquela oportunidade? Mas, com tudo combinado, que fazer? O dilema moía-me a cabeça e ... do sono nem vestígios. Cansado acabei por adormecer às tantas, sem chegar a uma conclusão. De manhã decidiria. O relógio tocou às quatro da manhã, e meia hora depois estava com todos os apetrechos de viagem e pesca, dentro do jipe do Alfredo. Deixei que o destino resolvesse o que não tinha tido coragem para fazer... mas aquela cara não me saía da cabeça... ela era linda mesmo! Todos notaram que eu não estava nem ali, mas fui dizendo que o sono me transformava num robot. O Carlitos não enguliu, ele que tinha topado a cena de véspera. A viagem foi monótona, Manhiça, Palmeira, Xinavane, Incoluane, Macia, e só quando a lagoa do Bilene se avistou majestosa como sempre, naquele nascer do sol tão mágico é que alguma excitação se manifestou na malta. O Necas, cioso do seu palmarés piscatório vaticinava nova vitória com dois marrecos, três garoupas crescidas (+ de três quilos) cinco ou seis sargos, e pelo menos um de areia (tubarão...).
Nem o frio da noite no lado de lá, no oceano o incomodava, tínhamos víveres para os três dias, que segunda era feriado... Chegámos ao Bilene e fomos ao Ferroviário procurar o barco para o carregarmos para a travessia e.. desespêro absoluto, o motor do barco estava avariado e, nada feito. Aguardámos pelo mecânico, não se podia fazer mais nada. Enquanto isso, umas banhocas, e apreciar os veraniantes que chegavam de tudo o que era lado. E, aquela carita que me não largava a memória. Já todos reparavam que estava na lua... Só não sabiam a razão daquela evasão. Depois do primeiro banho, eram dez horas, o sol já aquecia, o mecânico ainda não tinha aparecido, tudo contribuia para o desconsolo, até que... oh fada do destino, ela apareceu-me ali defronte de mim em fato de banho, mais linda que nunca, e nem sequer olhei bem para os pais, eu fui logo ter com ela. Soube então que vinham passar aqueles dias no Bilene, e eu soube logo que a minha pesca estava condicionada. E assim foi, já não fui para o outro lado (mar aberto) e fiquei por favor, num quarto da casa dum amigo do meu Pai, no alto do Bilene, ao pé dos CTT. Aquela empatia estranha, porque muito forte, abriu-nos a oportunidade de galgarmos etapas. Passados minutos, estávamos convencidos que nos conhecíamos havia anos. Ela tinha uma amiga curiosa, porque era loura e ela sendo morena, faziam um contraste muito giro, e eu ali no meio das duas feito princípe ... com sorte! Não podia ser melhor, uma namorada, uma amiga para tapar a situação e... Bilene, querido Bilene, que fazes renascer das cinzas, um amor novo, mesmo depois do maior desgosto... Oh Colégio Barroso, que tão ditosas meninas acolhia, e eu ali tão perto no liceu. O príncipe com sorte, estava mesmo cheio de sorte, a Maria Emília e a Ivone passaram a ser, assim de repente, o centro das minhas atenções. Passámos a ter uma curiosidade enorme "pelo desenvolvimento" do Bilene, e nunca tomávamos banho na praia junto dos pais... Na primeira tarde, no parque Flôres, num momento mágico, que a amiga deixou, por necessidades fisiológicas repentinas, surgiu o nosso primeiro beijo, e foi fenomenal! Eu que já tinha prática, porque do namoro anterior, havia registado uma "longa experiência" de ... juro (!), pelo menos cinco beijos! Pois, era assim naqueles tempos, e eu era dos mais felizardos, e recordo que as surpresas foram enormes. Quando a noite caíu, junto às tendas do "camping" onde se encontravam, com mais três famílias, fui convidado a juntar-me ao grupo e jantar ali com eles. Uma senhora, que deduzi chamar-se Alzira, aproximou-se de mim, mas de uma forma denunciadora de alguma solidariedade. Fez-me perguntas e mais perguntas, sobre mim, sobre a família, os estudos, eu sei lá que mais... Mas fui aprovado, pelos vistos com distinção, pois tive logo convite para tomar as refeições todas com eles... só dormir é que não... Mas quem era aquela senhora benfazeja, e pelos vistos com tanta autoridade na família? Era uma tia, a D. Alzira, mulher de convicções, muito aberta, muito "pr'á frentex", para a altura, criticada em sussuro, que ela tinha argumentos para impor as suas ideias. Com aquela "cunha", eu era cada vez mais um príncipe com...sorte, consolidado! Foram dias de "wine and roses" como dizia a canção, que passava tantas vezes, quantas a tia Alzira queria, na voz do Eduardo Jaime, pois então! Foi um tempo de felicidade. A pesca? Nem me lembrava mais... Mas tudo o que é bom, também acaba, e eu vi chegar o fim daqueles dias. As despedidas foram sentidas, mas as promessas essas eram juras, juras de amor adolescente, mas vivo a começar a ser adulto. Desmancharam o acampamento e sairam depois do almoço. Eu fui para o ferroviário, com a minha bagagem, e imaginem com as minhas canas de pesca... Ao fim da tarde, os meus camaradas chegaram, radiantes com uma pescaria paupérrima, mas com aventuras de peixes incríveis, que se soltaram dos anzóis, mesmo ali á beira praia... A viagem de regresso, foi de penoso cansaço para eles e de maravilhosos sonhos de amor para mim... Também, quem manda ir à pesca ao Bilene, no mar, quando no lado de cá havia tanta sereia linda.

As variadíssimas transformações na minha vida, surgiam-me na mente em catadupa. Por nada atendia a conversa da malta. Eu estava "ocupado", a engendrar como haveria de fazer, para ir ao colégio Barroso, namorar com aquelas restrições todas. Das quatro às quatro e meia, na confusão da saída das externas, era a melhor hora para ir quase lá ao pé, saber dela, ou eventualmente encontrá-la. Namorar naquela época era complicado mesmo! Visto com olhos actuais, dava uma bela peça de humor... velho! Mas era assim, e como narrador de mim mesmo, devo à verdade, a própria verdade. Beijinhos? Não, nem vestígios...
Até que ao fim de dois dias apenas, quando nem afinadas estavam as manobras de aproximação, surge a notícia, assim de chofre: o pai tinha sido admitido no Monteiro & Giro, com um cargo de gestão importante e colocado em Mocuba! Ficaria ali, no Barroso até ao fim de Fevereiro, e seria transferida para Quelimane, para o colégio de NSConceição...
Fiquei, muito abalado, confesso, num ano tinham sido dois desgostos de amor colegial, sem que tivesse sequer tomado o gosto. Ai tia Alzira, tia Alzira, a nossa beneficente, lá arranjou uma saída e acompanhou-nos para uma despedida que ficou memorável: no Polana, ao som do I CINQUE DI ROMA. Aquelas melodias, aquele som, dois jovens, perdidos num ambiente de adultos, para adultos, de moralidade pintada em tela rota... Muitas juras fizémos... sem saber que nunca se cumpririam... aquela era mesmo a despedida. Ficava a vontade de escrever, de revelar sentimentos, genuinos, nobres, puros, que a nossa condição permitia que tivessem caracter de verdade, a única verdade que admitíamos... como era bom voltar a sentir essa dourada ingenuidade... E, foi assim que despertei para a escrita das emoções, para a poesia, porque nela encontrava a forma de lhe dizer o quanto era importante na minha vida. Até que um dia, todo este cenário se modificou, a minha menina apanhou uma tuberculose difícil e foi para a metrópole, Braga por sinal, tentar a cura com outros climas... Nem sequer soube da nova direcção... eu era apenas um peão ignorado naquela história, e nem a tia Alzira me valeu, porque nunca mais a vi.
Ficou uma certeza, a verdade do que senti, a beleza de tudo o que recordo, com aquele Bilene a dar o seu valioso contributo. Quarenta anos mais tarde, voltei a encontrá-la em Braga, funcionária dum banco, meramente por acaso, estava com a minha afilhada (a mais bonita do mundo) e quando me dirigi ao balcão, vi uma cara conhecida, que o meu coração assinalou! Ela sorriu, e disse-me com toda a simplicidade: "Olá Ricky, tens ido ao Bilene?" Era a nossa chave, isso mesmo, o Bilene, porque tinha sido importante mesmo. Soube depois que a tia Alzira tinha falecido, que era quase avó, mãe de dois filhos... E ficámos assim, a contemplarmo-nos durante uns minutos, deixando falar o silêncio... Depois, depois, regressámos à vida conscientes que o que tínhamos vivido, tinha mesmo valido a pena...
Ricky

segunda-feira, novembro 14, 2005

Memórias do Liceu


Hoje trago-vos memórias do liceu, que tem mais de quarenta anos, mas são histórias deliciosas que ainda me fazem sorrir... e, não só. Espero que gostem...
Memórias Parte I

Naquele dia azarento, tudo me corria mal. Cheguei ao liceu com uma cara de poucos amigos. A minha malta estava toda de trombas... Fiquei preplexo! Também? Afinal a razão era outra, o vice, que estava como reitor substituto, porque o "Vieira Júnior" estava de graciosa, tinha posto em tudo o que era lado, avisos bem elucidativos " Proibido Fumar - ... o desrespeito a esta directiva .... pode ir até à suspensão de 10 dias..." Era grave, sobretudo para aqueles "meninos" como nós - 5º, 6º e 7º anos - que já se consideravam SENHORES do seu nariz. Estávamos a ser tratados como crianças, e isso era mesmo "ofensivo"! Fizémos uma reunião de emergência, e fomos ouvir os mais velhos - 7º ano! Aqui a hierarquia era mesmo para valer. Ali estavam o Manel, o Xico, a Maria João, a Maria Emília, a Vitória, enfim as grandes vozes. E ficou combinado...
No dia seguinte de manhã os meninos traziam calções e "meinhas" com sandálias - à pipi-, alguns com peitilhos, e elas vestidas com vestidinhos curtos, com trancinhas e lacinhos..... E, eles com carrinhos de "Dinky Toys", de joelhos no chão num vozeirão "tttrrrruuuummmmmm", "pipipipi", etc... todos aqueles ruidos dos carros em dia de corridas... E elas? Com bonequinhas que embalavam com uma ternura tal, que embevecia o mais distraído.... mudavam os vestidos às ditas, com um cuidado extremo..... Bem, a confusão foi total... O Catarino, o Cansado Gonçalves, o Cândido Lopes, o Álvaro de Moura, a Rute Garcez, e mais uns quantos professores , riam às bandeiras despregadas e.... como que por encanto, os avisos no fim do dia desapareceram.... A vitória foi total!!!
Passámos a tratar, com uma delicadeza tamanha, o vice reitor pelo senhor Gonçalves...
Memórias duma época linda da minha vida, 1959/1960.
Memórias - Parte II
O dia havia corrido lento, e complicado. Às sete tínhamos tido "chamadas em História" com o Túlio de Campos, chamadas chatas, pois, se ele não pedia datas, pedia a caracterização das épocas, assim a modos que notícia jornalística.... Por outro lado era o, sempre difícil 5º ano, com nove cadeiras - quatro de letras e cinco de ciências- como bem se lembram alguns de vós. Era assim a modos que a transição do gaiato crescido, para o adolescente espigadote, com direito a namorada, com autorização "papal", isto é dos pais... Depois, às oito tivemos o Laborde Basto a Inglês, sempre bem disposto, de lacinho impecável, de saberes sempre dispostos a disparar. Valeu, porque descansámos antes dum ponto de Matemática, com o Álvaro Júnior, sempre melhor que o José Guerra do ano anterior... ás dez a professora mais querida da malta, por substituição temporária do Simão, sim o tal "macaco simão" (sem ofensa e com todo o carinho...), a Lourdes Cortez ... (ai literatura, literatura... gente pequena de bicos de pés, em atitude estúpida, uma horrível visão... mas que aquela mulher era bonita, isso era...) A seguir era Física, com o inefável Xanico, que falava axim sem emenda.... A aula prática, de laboratório, naquele anfiteatro que haveria de ser "tortura" no terceiro ciclo... Mas, adiante, íamos com alguma expectativa para vêr como era uma "...transformação da água em hidrogénio e oxigénio, por acção da electricidade..." Santa ignorância de cábulas profissionais, mas naquele dia memorável, mais coisas iriam acontecer... Tudo preparado para o evento, a turma sentada no anfiteatro, lá em baixo o Xanico com o ajudante, o chefe de turma o Saraiva de Carvalho, e num grupo bem juntinho os notáveis daquela turma o Salema, Necas, Neiva, Gonçalo Fevereiro, Dino, Jorge Carmo (basquetebol/Desportivo), o filho do Laborde Basto, Merali, Rui Calrão, e eu claro! No momento exacto da ligação dos fios electricos para a electrólise, alguém que eu nunca soube quem era (e ainda bem...safa) estourou com um saco de papel vazio, de amendoím com açucar, que vendiam à porta do liceu. O som ampliado pelo laboratório, de janelas e portas fechadas, foi para além do que naturalmente o autor pretendia e a "coincidência" do momento da ligação fez com que o Xanico se assustasse e entornasse duas proveta, o Saraiva de Carvalho se tivesse agarrado ao professor, e a turma assustada que não esperava por aquilo. Foi difícil acalmar. E, depois, porque todo o liceu se deu conta, um contino queria chamar os bombeiros, sei lá que mais... O Vieira Júnior, reitor ( o nosso querido reitor, excepcional) à época, entrou na sala e pediu esclarecimentos para o que se tinha passado. Que o rebentamenbto era do saco já se sabia, faltava saber quem tinha sido, e aí a turma fechou-se em copas, nimguém se desmanchou, por isso ficámos a saber pelos nossos colegas, e até pelos do sexto e sétimo, "nossos patronos" que haveríamos depois de continuar, que éramos o exemplo da solidariedade estudantil, da camaradagem, enfim heróis! E, o que isso rendeu nas miudas? Foi giro, foi giro...
No último dia de aulas o Vieira Júnior foi à sala dar os parabéns pelo nosso comportamento solidário... exaltado por outro facto que contarei brevemente...
Nota: os nomes são verdadeiros e a turma célebre o 5ºC .
Aos meus camaradas de então, se me lerem algures, o meu mais forte abraço, e digam-me lá quem foi afinal?
Memórias Parte III

O Copianço do ano...

Estávamos à beirinha do fim do segundo período, o tal das decisões, e logo no 5º ano. Com bailes de finalistas, e de ano à porta, grandes farras em perspectiva, com os campeonatos de futebol a começar, o tempo para estudar era de facto diminuto... As noites longas, o sono esse dava cabo de nós... depois havia os namoricos, que era coisa prioritária, pois então e, ás vezes dava cá uma "trabalhera...". Ponto de Geografia, com o Cardigos, único ponto do período, um tirateimas das chamadas diárias. Eu até estava bem, porque estudava geografia todos os dias, porque no primeiro dia de chamadas com o Cardigos, sendo eu o nº16, tive o azar de ser o primeiro a ser chamado. Havia chamadas todos os dias, pois ele dividia a aula em duas metades, a primeira, de chamadas sobre a mtéria dada, e depois explicação da matéria seguinte. Não contava, e ... pimbas tive zero ou perto disso. Na aula seguinte não contava que ele repetisse a dose e... zás, dizia-me ele, à Cardigos todo formal, de cachimbo na boca " Senhor Carvalho dos Santos, outro zero. Mas, como eu gosto de si vamos fazer um contrato, o senhor para levantar a nota, tem dois zeros, vai ser chamado todos os dias, responderá sempre a seguir a uma falha dos seus colegas". Claro que se havia alguém bom a geografia era eu!
Mas os meus colegas estavam à rasca... Com habilidade e muita astúcia, descobrimos que o ponto era feito no liceu e copiado a "stencil" e devidamente guardado. Se chegar ao original era impossível, que era feito do stencil depois de utilizado? Em que caixote do lixo cairia? Descobrimos o stencil que exposto à luz do sol revelou todos os seus segredos. Fomos imprudentes pois conseguimos todos uma boa nota, tipo 17/18 o que se revelou muito mal ideia, pois o Cardigos ficou ciente que tinha havido copianço, mas como? Fechou-nos na sala, falou connosco em grupo, um por um, nada! Esta situação levou tempo e mais tempo, mas nada! Ninguém se descozia, e o único prejudicado era eu, que por via do processo das chamadas, sabia mesmo da matéria! Só no final do ano, na última aula, com a promessa solene que não haveria castigos, o Director do 2º ciclo, o mauzão do Cardigos, se mostrou bondoso e pediu-nos por tudo que lhe contássemos o segredo. Saíu da sala para que decidíssemos sem interferências, e nós atendendoà forma como se nos dirigiu, contámos tudo. Esta verdadeira lição de solidariedade, juntamente com a do Xanico, memórias II, valeu-nos a fama de melhores alunos do liceu em... companheirismo e solidariedade. Era uma turma e pêras, ninguém falhava, aquele 5ºC era mesmo famoso....
Ricky

quinta-feira, novembro 10, 2005

A palhota Maticada

A palhota Maticada
Saímos de madrugada da cidade, duma LM ainda adormecida, prestes a acordar e começar a correr nos labirínticos corredores de sempre, na luta diária, programada e ciclicamente cumprida, com desvelo, preguiça... e sono. Sono, também tínhamos nós, nada que não pudéssemos assustar com um café no Manuel Rodrigues, mai’la rocha do costume. Em viagem, numa viagem de todo previsível aí seguimos nós, eu o Soares Ferreira (que Deus o tenha) e o Roseiro, ambos dos CFM (eu estava como passageiro em férias) que iam escolher travessas de madeira para as linhas dos ditos comboios. Duzentos e picos quilómetros depois, eis-nos a chegar a Manjacaze, para o almoço. Confesso que estava com fome. Da ementa comemos o frango à cafreal da casa, pintado com um molho de piripiri, que segundo a D. Amélia, era segredo da casa. Eu não sei se era mesmo segredo, mas que era divinal, era, e isso não era segredo nenhum. Depois de almoço, com o tanque do jipe Land Rover, de capota nova, cheio de gasóleo, iniciámos a etapa final até à Serração Mecânica. Competia-me a mim conduzir agora. A estrada de terra batida primeiro, enquanto foi a que ia para Homoíne, para depois do cruzamento, seguirmos finalmente por uma outra, um pouco melhor que picada. A primeira fase, de savana e baixios, como a lagoa do “Estonhana”, com matope e água nos rodados, das chuvas da semana passada. Só por uma vez usámos a redutora para a tracção às quatro rodas. De repente, eis que o mato selvagem nos saúda, dois corpulentos “nhalos” machos e umas quantas fêmeas assustadas abalavam savana fora, naquele correr elegante e suave, qual bailado de opereta, em saudação à vida livre e natural. Parando mais adiante, debaixo duma micaia, das que despontavam aqui e ali, no capim, ainda verde, da altura do joelho, escutavam os ruidos alheios àquele mundo maravilhoso. Era a recepção da malta naquele ambiente especial, que o citadino não poderia entender. Aquele quadro, dos “nhalos” não era reproduzível, por nenhum cenógrafo por muito bom que fosse! Aquele cheiro, aqueles sons, aquela paisagem, aquela luz radiante, a alegria de viver, que nos era mostrada pelo cantar da passarada, do saltitar das perdizes, que depois de desvendado o seu camuflar, ensaiavam longos voos a perder de vista. As galinhas do mato, tontinhas e previsíveis, mas rápidas no esconder nas matas, e de voo mais difícil, tipo Jumbo 747 com a carga toda... Mudámos depois para estradas de areia. Mato de árvores de porte mais forte, terreno de cultivo de mandioca, amendoim, e nos intervalos de ananazes. Claro que comemos ananazes, sem geito nenhum, pois só tínhamos um canivetezito... mas a vontade era mais forte que tudo... Coisas de citadino no mato. Apenas me era devido uma crítica, porque afinal, eu tinha sido criado no mato e tinha obrigação de saber do que fazia geito ali. Mas estas peripécias coloriram uma viagem maçadora em termos físicos, mas muito compensadora e enriquecedora sob todos os outros aspectos, e stress (?) que é isso? Chegámos à Serração Mecânica e distribuiram-nos os aposentos, e alguém teria de ficar fora do edifício numa palhota maticada. Aceitei logo essa hipótese, que me foi concedida. Finalmente iria viver durante quatro dias numa palhota. Ambiente fresco, cheio de mistério, mais imaginado que real, mas que eu cultivava, pois queria sentir o pulsar de áfrica ali dentro, daquela habitação própria. Arrumei as “timpachas”, tomei um banho e preparei-me para o jantar na serração, com todos à mesma mesa.

A Palhota Maticada II
Com tudo arrumado, banho tomado, segui para o edifício principal, onde se seguiria o jantar. Refeição para trabalhadores, que a mim me servia perfeitamente, era “teenager” inocente, e comia bem... Lembro-me, que o prato principal, era cabrito assado no forno. Depois do café, assisti a um jogo de cartas de “alto nível”, uma suecada das antigas... Falou-se um pouco de tudo, de futebol, de caçadas, principalmente, com os exageros dos tiraços certeiros... Não são só os pescadores... Porque a manhã. iria ser madrugada, fui para a palhota, experimentar a sensação nova, que tanto me estava a entusiasmar. Mesmo radiante, e excitado, pouco tempo depois, adormeci. Quando de madrugada me acordaram, para visitarmos o corte na floresta, senti um bem estar enorme, de quem havia dormido descansado, oito horas seguidas. O pequeno almoço na serração era uma coisa muito séria. Bife com ovo e batas fritas, sumo de laranja, café com leite, pão, manteiga, queijo e chouriço... E, a fruta, papaia, laranjas ou mangas. Isto ás seis e meia da manhã! A viagem até ao lugar do corte, foi penosa e cheia de percalços normais, em terras arenosas, por sulcos enormíssimos feitos pelos rodados dos monstruosos camions, de transporte de troncos, que por ali andavam, como reis da paisagem. Por vezes, fazíamos nós um novo caminho. Mais adiante, outra savana com capim baixo e terreno lodado e por vezes seco e duro. Criando novos rumos para fugir àqueles sulcos, por entre o capinzal, corríamos o risco de encontrarmos pelo caminho um morro de formigas (muchein) que nos poderia fazer voltar o jipe, porque ali, compensávamos o tempo, acelerando um pouco. Chegados ao local de corte para que fossem escolhidas as árvores para as travessas, os inspectores fizeram com minúcia o seu trabalho. O almoço em serviço, foi composto por sandes diversas, vinho, águas, e laranjadas e cocacolas. Só ao final da tarde iniciámos o regresso. Quase a chegar a casa, conseguimos caçar umas perdizes, que serviriam como petisco delicioso acompanhado com uma laurentinas bem frescas. O jantar de fim de jornada, após o banho retemperador, foi divinal. Era dia de bacalhau com batatas e couves... O serão foi curto para os citadinos pouco habituados àquele ritmo. Regressei enfim à palhota para voltar a dar azo à imaginação do sentir ali, a alma de áfrica. Abri a janela, única, deixei apenas a de rede fechada, para ouvir os sons tão característicos da incomparável noite africana. Nem um mosquito, nem uma aranha, aquela palhota era um paraíso. No dia seguinte era dia de serração, isto é, não haveria saídas para o exterior, e depois era sábado, o ultimo dia de campanha, já que o regresso estava marcado para domingo.

A Palhota Maticada III
(O Mistério desvenda-se...
Dormi como um justo ao som da partitura do “Nocturno” de África... Acordei, recomposto do esforço da véspera, e até cheguei atrazado ao pequeno almoço, com aquela ementa fortíssima, agora ás oito horas, já com o sol a aquecer tudo e todos. Como para mim era dia de folga dei uma vista de olhos pela serração, onde aqueles toros bem pesados e grossos, eram transformados em lâminas grossas (tábuas), que partiam por caminho de ferro até Manjacaze e posteriormente para o mundo. Visitei a escola primária para os filhos dos trabalhadores, e vi as dificuldades que um professor vindo da “metrópole”, directamente para ali, para entender aquelas crianças adoráveis, que não entendiam o que dizia o professor porque não “dominavam o português” que ele falava... Lá lhe expliquei que só com aulas suplementares de português levaria a água ao seu moinho. O Luis Ferreira da Silva assim se chamava o novato professor, confessar-me-ia quarenta anos mais tarde, que aquela experiência, ali no mato, tinha sido algo de tão maravilhoso que nunca poderia esquecer na vida. Fizemos uma amizade forte que ainda hoje perdura, e sou o padrinho de casamento, que deu três maravilhosos frutos, uma rapariga, médica, e dois rapagões, um piloto (sr. Comandante) e outro um informático de truz... Ainda hoje recorda a Serração Mecânica, aquele isolamento, que mais tarde receberia a esposa, vinda de Viseu... Mistérios de áfrica que citadino tem dificuldade em entender.
Passei o dia numa experiência pedagógica interessantíssima, vi como funciona uma indústria de madeiras na sua raíz... Mas o melhor estava para vir... O almoço foi um arroz de cabidela genuino, com frangos criados na rua (no mato), que não esquecerei nunca mais. À tarde depois da sesta, naquela palhota de sonho africano que tanto me fascinava, fui participar numa caçada que demorou até ao jantar. Era a oferta da casa, aos que buscavam uma maneira de contar aos amigos, que tinham... feito uma caçada! Não fomos longe e conseguimos caçar umas peças de caça habituais naquela zona: um nhalo e dois cabritos. O suficiente para motivarem longas histórias de convívio, lá na cidade... Á noite houve festa no último jantar da jornada. O rancho foi melhorado e havia dois pratos (!). Bacalhau assado e caril de cabrito... estavam fantásticos, o que motivou uma oferta generosa do Soares Ferreira à cozinheira... Tudo bem regado, foi um previlégio poder escutar histórias e mais histórias do mato. Salvo os exageros, sõ, foram e serão sempre uma lição de vida. Daqueles que deram a sua juventude por aquele país. Dizia-me o Luis que tem consciência de ter ensinado a lêr e dar o ensino primário, a centenas de garotos, ali nos confins do mundo. E, como isso hoje nem sequer é lembrado! Fui-me deitar mais rico e, sobretudo, feliz. Acordei de manhã já com saudades da palhota maticada. Estava nesta angústia da partida, deitado, olhando para o teto, quando de repente vislumbro num dos paus de suporte do tecto uma cobra! Eu sei que existem cobras “domésticas” que os africanos usam para limpar de insectos e ratos as suas palhotas... mas aquela era ou não dessas? Saí, a medo, e procurei o primeiro moçambicano que encontrei, o ajudante de cozinha, e questionei-o. Foi vêr e explicou-me que poderia ficar descansado que nada me aconteceria. Aliás ela estava já a retirar-se para o seu poiso. Deixei de a vêr, arrumei as coisa (timpachas...) retirei-me saudoso daquele lugar. Foram as despedidas e o regresso a Lourenço Marques. Mas, ainda hoje me lembra que convivi com uma cobra, partilhando a mesma palhota, e quiçá absorvendo aquele ar misterioso, aquele feitiço que África exerce em todos os que com ela convivem. Moçambique em particular, dobra,, acho eu, esse fascínio. Não esquecerei mais aquela palhota maticada...
Dedico esta memória ao Luis e a todos os que deram o melhor da sua vida, a juventude, por aquele Povo e aquela terra...

segunda-feira, novembro 07, 2005

Viagem ao rio dos elefantes....



Férias em Mapulanguene – Viagem ao Rio dos Elefantes
À memória de Rui Calrão


I - A IDA


Naquela noite levámos algum tempo a adormecer. Estávamos ansiosos pela chegada da madrugada. Íamos com o meu pai ao Rio dos Elefantes, e a saída estava marcada para as quatro horas da manhã. A experiência ia ser fantástica, tão diferente do liceu, do "xilonguine", (a 210 kms e Magude a 100 kms) das matinées do Scala e da praia da Polana. Finalmente acordámos ao chamamento da mãe Maria, com o pequeno almoço já feito, café com leite, torradas com manteiga e ovo mexido com rodelas de chouriço, e meia papaia para desjejum, isto depois duma chuveirada para acordar... O farnel estava já acondicionado nas cestas e nos termos, o Land Rover estava já "carregado", com uma "ponte" 22 e uma 30, mais uma caçadeira para as galinhas do mato e perdizes. Finalmente a caminho, ainda de noite, o meu pai, nós e o ajudante Bingadze, homem sério, competente que "adivinhava" tudo o que precisávamos, sem ser preciso pedir. Logo à saida de Mapulanguene, para leste, junto à fronteira com a A.Sul ( do outro lado era o National Park Kruger), avistámos dois coelhos no caminho, atarantados com os farois do jeep, bem a geito, mas o meu pai "sossegou-nos" os ânimos – Meninos temos 80 kms para andar e a estrada não é fácil.Calámo-nos claro, mas ficou-nos uma vontade de atirar...O dia amanheceu alegre, o cheiro a mato fresco, pelo cacimbo da noite, o alegre chilrear dos pássaros, de todas as cores e feitios, as primeiras rolas, as perdizes a esvoaçarem assustadas, e até uma cobra a atravessar a estrada, as micaias, sempre bonitas com as suas folhas pequenas e bem arrumadas, (desde que longe da pele, claro) aqui e ali as massaleiras amargas, intactas, e de onde em onde as outras, doces, devassadas pelos macacos e elefantes, que se não deixam enganar. Eu juraria que as massalas são iguaizinhas, mas não, as amargas ninguém lhes pega e as doces desaparecem logo. Tentavamos encurtar caminho, indo pela baixa, com capim alto, produto das chuvas, já seco, e o "velhote" guiava com cuidado não fosse aparecer um morro de "muchem" (formigas) e virar o jeep. Um pouco à frente apareceu uma manada de impalas e de cocones, e um impala macho bem á nossa frente, atónito, a uns vinte metros... e o meu pai a dizer ... – meninos temos tempo na volta, admirem só a beleza que eles tem... Enfim, outra oportunidade perdida, que nós geriamos com dificuldade. O Rui transpirava e eu suspirava.... De repente, um espectáculo raro! Um jacaré espetado numa árvore seca, numa espécie de forquilha. Que fazia ali, um jacaré a dez kms do rio? Como fora ali parar? Dois residentes da área que por ali passavam explicaram-nos a razão de ser do mistério: - O jacaré meteu-se com uma cria do elefante e a mãe zangou-se e agarrou o jacaré e trouxe-o até aqui e espetou-o nesta árvore... Imaginem a cena e meçam a ira daquela mãe!!!Mais uns kms e finalmente chegámos ao rio dos elefantes ou rio das pedras como também é conhecido na zona. Debaixo duma grande figueira africana, já velhota, certamente a matriarca das outras que a rodeavam, puxámos dos cestos e fomos almoçar naquela sombra maravilhosa. Frango à cafreal, molho picante, arroz de coco, pão, coca-colas e vinho, bananas e a sestazita para retemperar, vendo o fiozito de água a correr sobre as pedras, lisas e brancas. Deitados, tentávamos descobrir os pombos verdes que, de quando em vez, se mexiam nos ramos da figueira e fazíamos disso uma espécie de jogo...


II – O Regresso


Depois daquele descanso providencial, depois de arrumarmos as "timpachas", subimos a ladeira e lá nos direccionámos a oeste rumo a casa. Os nervos estavam à flor da pele, o "velhote" ia dar finalmente a sua licença para caçar. Na savana, de capim alto e seco, com os arvoredos ao longe nas partes mais altas, o sol fazia-se sentir e de que maneira. Finalmente, chegámos ao centro do que iria ser o "teatro de operações". Sùbitamente o velhote parou o jipe, e disse-nos: têm uma hora para mostrarem o que valem, as impalas estão além, têm o sol e o vento a vosso favor, agora a pé, toca a caçar. Esta é a primeira lição que vos quero dar, pois caçar não é matar, há que dar à caça oportunidade para se defender. Boa sorte. Que castigo! A pé!? Pois, era a lição, nada de vantagens... agora percebíamos porque nos tinha proibido de atirar de manhã. A caça estava parada e nós de carro tinhamos toda a vantagem. Mas lá fomos e tudo correu mal... cansados, apenas conseguimos uma impala macho ( porque se fosse fêmea tinhamos o velhote à perna e de que maneira! Num tiro muito de sorte já no regresso para o jipe e do ... saudoso Rui. Valeu durante o resto da viagem uns tiritos bem bons de caçadeira que nos renderam umas galinhas do mato e umas perdizes, que muito agradaram à mãe Maria, que nos proporcionou nos dias seguintes belas refeições ... moçambicanas, em pleno mato! Bem, esta viagem deu para contar estórias, um pouco aumentadas, claro, naqueles corredores do liceu, que vocês nem calculam. Conseguimos ter a atenção das miudas durante um período inteirinho, para desespero dos nossos colegas...ahahahah. Foi mesmo bom. Desta estória ressalta a saudade de um amigo, que DEUS o tenha em sua Santa companhia, e a lição do papai, velho defensor da fauna africana...
Ricky

quinta-feira, novembro 03, 2005

De Mapulanguene ao Kruger National Park


A visita ao National Kruger Park

Estávamos todos ansiosos pelo dia seguinte. Eu não conseguia disfarçar o que me ia no pensamento. Estávamos à beira de conseguir tornar realidade, o que só poderíamos vêr no Museu Álvaro de Castro, ou episòdicamente, aqui ou ali, quando fazíamos uma fugida ou outra, pelas savanas ali ao lado. Mas, variedade, era o que nos esperava... e, de tudo! Com grandes dificuldades, lá adormecemos. Logo num ápice, pelo menos foi o que nos pareceu, a minha Mãe nos acordou. Eram quatro da manhã, tínhamos de nos preparar, tomar o pequeno almoço de desjejum e, carregar o jeep Land Rover, com o pique nique , pequeno almoço real, e lanche, já que o almoço, tomávamos no Skukuza ou Satara, acampamentos do parque, que tudo tinham. Saímos de Mapulanguene, já eram cinco e picos, o que perturbou o meu Pai que tinha combinado com o Ranger, do outro lado do rio, no caminho para Satara, ás cinco e meia. O sol despontava, e se a noite tinha sido mal dormida, a “esperteza” provocada pelo ar da manhã, compensada pelo sol, que despontava majestoso, para um dia que se adivinhava, quente e próprio para uma visão explêndida, do que poderíamos vêr. Na hora programada, chegámos ao ponto de encontro, e lá estava o ranger do parque, o senhor Merk, descendente de holandeses, e a sua esposa Marie, a quem chamávamos carinhosamente “misses Merk”... O meu Pai falava com ele, fluentemente, Ronga, já que nem ele sabia português, e o meu Pai não sabia inglês suficiente... Era uma situação giríssima, que fazia rir, quer os naturais sul-africanos, quer os moçambicanos, esses sim falavam a mesma língua. Feitos os cumprimentos, dirigimo-nos para Norte, em direcção aos Olifants, acampamento, junto ao rio dos Elefantes, onde supostamente veríamos elefantes em quantidade, mas também crocodilos, hipopótamos (cavalos marinhos) e outras espécies que mais a sul seriam mais difíceis, como leopardos e “gnus”. Começámos por vêr as nossa amigas e companheiras de jornada as impalas, cocones, nhalos, gazelas, isto é toda a espécie de antílopes, até Kudos, bem mais difíceis... Com o olhar atento na vegetação predominante, as diversas espécies de micaias, massaleiras diversas, aqui e ali com tufos de capim alto (capim elefante...) e em zonas determinadas de lagoas sazonais, uma ou outra figueira, um ou outro canavial... Quando batiam as nove horas, parámos, num miradouro, com sombras frondosas de figueiras centenárias, para tomar o pequeno almoço real. Trocámos experiências culinárias, o nosso bom presunto, pelas mortadelas e doces sul-africanos, sobretudo o mel maravilhoso, ali mesmo do parque Kruger. Ficámos então a saber, que a partir daquele momento, os guias teriam as espingardas prontas para agir, o nosso jeep ia no meio, porque iríamos por uma estrada proibida aos visitantes normais, e iríamos encontrar elefantes com crias, e eventualmente leopardos, e leões. Todos estavam no auge da expectativa. Agora é que vai ser! E, foi. As nossas expectativas não foram goradas, parecia que as espécies mais difíceis, se engalanaram, para nos oferecer, esse espectáculo único da natureza, ela própria, no seu esplendor! Vimos uma mamã elefanta com a sua cria, abanando as orelhas em ar agressivo, com as irmãs ao lado para o que desse e viesse, e com os paizões, ali bem pertinho para agir... Saímos pela calada com meiguice, e com uma vontade louca de passarmos despercebidos... Mais à frente, tivemos a sorte de vêr um leopardo numa árvore baixa, e uma cria mais à frente, já crescidota, e só de repente vimos a mamã ali meio encoberta pela vegetação, e... de pé atrás... Chegámos ao rio e do miradouro dos Olifants, vimos os crocodilos e ... mais além os hipopótamos... mesmo em cheio! Virámos para sul e com uma companhia de zebras reluzentes, fomos em direcção a Satara onde fomos almoçar às duas horas, sem esquecer a macacada que aparecia nos miradouros, e os “chipenhes” os antílopes mais pequenos que ali existem, isto para usar a língua ronga... Depois de almoço, um almoço de carne grelhada, e pão de mistura à inglesa... fomos para Nhokwane, e já não fomos ao Skukuza por ser tarde. No miradouro do Nhokwane deu-se um episódio, hilariante e ao mesmo tempo revelador, do ambiente da selva, sempre na sua renovação permanente. Num lago, estavam de um dos lados uma família de leões, alguns seis ou sete, deitados à sombra dum imbondeiro, dormiam a sono solto; perto de nós um elefante jovem comia as folhas verdes dos arbustos, e do lado contrário aos leões, estavam búfalos, girafas, impalas, zebras, kudus, que tentavam beber água, olhando sempre para a outra margem. Era um espectáculo verdadeiramente impressionante! Uma cena montada pelo produtor Natureza, e bem representado por animais autênticos, usufruindo de todo o seu estatuto! Ora, o leão mais velho acordou da soneca, e resolveu levantar-se... Toda a bicharada se pôs em fuga, de repente, sem olhar para trás... o chão tremia, parecia um tremor de terra... que espectáculo! Refeitos da cena, prosseguimos viagem, até que... Lanchámos, já na fronteira por nós violada, e preparámo-nos para regressar a Mapulanguene, onde chegámos exaustos mas, com histórias lindas para contar às miudas no liceu, nos corredores e nos intervalos, que nos renderiam atenções delas, e invejas dos nossos colegas... As férias caminhavam para o fim, as aulas aí estavam a começar, e os nossos encontros também... que bom!
Ricky
In livro a publicar...